Manaus em abril, São Paulo e Rio em maio: veja quando foi o pico da pandemia em 8 capitais segundo critério usado por epidemiologistas
Cidades registraram picos de sepultamentos entre março e agosto; junho marcou início da tendência de queda. Análise considera o excesso de mortes, que compara o total de enterros entre 2019 e 2020. O total de enterros e de cremações registrados neste ano em 9 capitais brasileiras revela que o impacto direto ou indireto da pandemia de Covid-19 levou a picos de sepultamentos entre abril e agosto nas cidades analisadas (veja abaixo o gráfico de cada cidade).
Os números confirmam ainda que a curva de mortes está em queda em capitais de todas as regiões do Brasil, inclusive as que foram mais duramente atingidas pela pandemia só após a chegada do inverno, em junho.
Excesso de mortes
A análise dos números de sepultamentos mostra o chamado “excesso de mortes”, conceito que usa o cálculo da diferença entre os óbitos registrados entre dois períodos, independentemente da causa.
“É importante tecnicamente olhar para o excesso de mortalidade porque é uma forma de corrigir qualquer eventual erro ou subnotificação na contagem das mortes pela Covid-19″, explica o epidemiologista e reitor da Universidade de Pelotas (UFPel), Pedro Hallal.
Hallal destaca que o excesso de mortes tanto mostra o avanço da pandemia como o efeito indireto dela sobre outras doenças. O reitor da UFPel lembra que a Covid-19 pode ter influenciado mortes por outras causas. “Pode ser, por exemplo, que tenha mais gente morrendo de câncer porque não estão buscando tratamento”, afirma Hallal.
O epidemiologista Paulo Lotufo, professor de clínica médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), lembra que o excesso de mortes pode ser um aliado na avaliação da pandemia em países como o Brasil, que não faz testagem do coronavírus em massa.
“Olhando o excesso de mortalidade, conseguimos perceber quando as mortes subiram e quando começaram a cair. Obter o dado da ocorrência de uma morte é mais fácil, não tem como esconder o enterro de um corpo, por exemplo. Avaliar o excesso de mortalidade ajuda quando não temos o diagnóstico certo dos casos de coronavírus” – Paulo Lotufo, epidemiologista
Uma reportagem do jornal “O Globo” de domingo (1º) aponta, com base em dados dos cartórios, que 15 das 27 unidades da federação já registram um número de óbitos perto do esperado para o mês. De acordo com especialistas ouvidos pelo jornal, os dados sugerem o fim da primeira onda da pandemia de Covid em metade do país.
Capitais mais afetadas
O levantamento do G1 considera Manaus, São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba e Goiânia, cujas prefeituras ou concessionárias do serviço funerário repassaram os dados mensais.
As cidades estão entre as 11 com mais mortes causadas pelo novo coronavírus no Brasil. A equipe de reportagem não obteve dados completos de Fortaleza (CE) e de Belém (PA), que também integram a lista, mas por isso não entraram no comparativo.
Os números obtidos permitem comparar os óbitos deste ano com os verificados em 2019 (e com a média de anos anteriores no caso de São Paulo e Belo Horizonte). Pesquisadores ouvidos pelo G1 explicam que o excesso de mortes em relação ao ano anterior mostra a trajetória real da pandemia na sociedade, já que o indicador considera todas as vidas perdidas, tanto por causa de Covid quanto por outros motivos relacionados.
Aumento repentino e os 3 fatores
Historicamente, o número de mortes mantém estabilidade de um ano para o outro, com variação de até 2% para mais ou para menos. Por isso, o epidemiologista Otavio Ranzani, do Instituto para Saúde Global de Barcelona, afirma que os dados mostram “aumento repentino” e por isso, o excesso de mortes pode ser atribuído ao coronavírus.
O epidemiologista Paulo Lotufo lista os três fatores que contribuem para o excesso de óbitos:
mortes causadas diretamente pelo vírus
mortes por doenças agravadas pelo vírus
mortes causadas pela falta ou demora no atendimento médico
Abaixo, veja a situação nas capitais, conforme os picos do excesso de mortes:
Manaus – pico em abril
A capital que primeiro atingiu o pico foi Manaus, que em abril viu o total de sepultamentos na rede pública ficar 179% acima do verificado no mesmo mês do ano anterior. Na cidade, foram 1.899 enterros, um total de 1.562 a mais.
Gráfico dos enterros em Manaus no comparativo entre 2019 e 2020
Arte/G1
Por causa do excesso, o sistema funerário da cidade entrou em colapso. Em média 100 mortos passaram a ser enterrados por dia. Antes, eram 30 enterros diários, segundo o Sindicato das Empresas Funerárias do Estado (Sefeam). Para lidar com o aumento das mortes, o principal cemitério da cidade passou a empilhar os corpos em uma mesma vala comum.
Em maio os números ainda estiveram muito acima do ano anterior, com alta de 120% por causa de 1.037 mortes em excesso no período. Apesar disso, os números caíram bruscamente em junho e nos meses seguintes.
São Paulo, Rio e Recife – pico em maio
Maio foi o mês em que São Paulo, Rio de Janeiro e Recife alcançaram o maior excesso de mortes durante a pandemia.
Gráfico dos enterros em São Paulo no comparativo entre 2019 e 2020
Arte/G1
Na capital paulista, cidade em que foi possível obter a média das mortes entre 2015 e 2019, os dados da rede privada e pública mostram números 43% superiores à média e 44% acima do verificado no mesmo mês do ano anterior.
“Os enterros começaram a diminuir a partir junho, acompanhando a evolução da pandemia” – Paulo Lotufo, epidemiologista
Gráfico dos enterros no Rio de Janeiro no comparativo entre 2019 e 2020
Arte/G1
No Rio de Janeiro, o aumento foi de 43%, e reflete um total de 2.510 mortes em excesso na comparação com o mesmo mês do ano anterior.
Gráfico dos enterros no Recife no comparativo entre 2019 e 2020
Arte/G1
No Recife, a alta no mês foi de 116% nos enterros, com um total de 1.252 mortes em excesso.
Salvador – pico em junho
Em junho, Salvador registrou o maior excesso de mortes durante a pandemia. No comparativo com os enterros registrados no mês passado, a alta foi de 141%, quando a capital teve 777 sepultamentos na rede pública, um total de 455 a mais do que em julho de 2019.
Gráfico dos enterros em Salvador no comparativo entre 2019 e 2020
Arte/G1
Belo Horizonte – pico em julho
Belo Horizonte verificou um aumento de 33% nos sepultamentos em julho, na comparação com o mesmo mês de 2019, chegando a 315 mortes em excesso. No caso da capital mineira, o G1 obteve os dados por mês desde 2017 da rede pública e privada. O aumento em relação à média foi maior, de 38%.
Gráfico dos enterros em Belo Horizonte no comparativo entre 2019 e 2020
Arte/G1
Brasília, Curitiba e Goiânia – pico em agosto
Na série analisada, as últimas cidades a registrarem o pico de mortes durante a pandemia foram Brasília (DF), Curitiba (PR) e Goiânia (GO). Em Brasília, o mês teve aumento de 81% nos enterros, que representaram 823 mortes em excesso. Em Curitiba, a alta foi de 33% (237 mortes em excesso) e, em Goiânia, elevação de 104% (676 mortes em excesso).
Gráfico dos enterros em Brasília no comparativo entre 2019 e 2020
Arte/G1
Gráfico dos enterros em Curitiba no comparativo entre 2019 e 2020
Arte/G1
Gráfico dos enterros em Goiânia no comparativo entre 2019 e 2020
Arte/G1
Brasil reduz testes de Covid em setembro, e especialistas alertam: taxa de positivos segue alta
VÍDEOS: mais assistidos do G1 nos últimos 7 dias