Nas Olimpíadas e nas empresas: Kelvin Hoefler reforça o poder dos quietos
A inédita medalha de prata do skatista brasileiro Kelvin Hoefler nas Olimpíadas de Tóquio teve uma repercussão inusitada que vai além dos esportes: jogou luz sobre os introvertidos.
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O brasileiro de 28 anos sempre reconheceu ser mais quieto, contrastando com um esporte conhecido pela extroversão. Durante a competição em Tóquio, afirmou que usava fones de ouvidos sem música para não ser incomodado e poder se concentrar. Nas entrevistas após a premiação, brincou com o assédio: “Me deixa ir embora”.
Seu posicionamento gerou uma repercussão inusitada. Leticia Bufoni e Felipe Gustavo, colegas de Hoefler no time brasileiro de skate cumprimentaram o japonês Yuto Horigome, medalhista de ouro, mas não o brasileiro.
“O Kelvin nunca está com a gente nos rolês, nunca faz parte das nossas atividades. Por opção dele”, afirmou Bufoni em vídeo. Hoefler respondeu apenas que “sou um cara pacato, quietinho no meu canto”.
Para além das polêmicas das redes sociais, no esporte e nos negócio os extrovertidos tendem a ter mais espaço. Uma das estrelas dos jogos de Tóquio, a tenista japonesa Naomi Osaka, virou porta voz desta pauta de “recursos humanos” nas últimas semanas.
Número 2 do mundo e estrela na cerimônia de abertura dos Jogos, ela decidiu, em maio, parar de participar de entrevistas coletivas — e por isso decidiu abandonar o torneio de Roland Garros. Ela afirmou que a demanda a sobrecarregava mentalmente, mas a decisão provocou um embate com patrocinadores e organizadores dos principais torneios. Osaka, 23 anos, diz que é tímida e que ainda está se adaptando aos holofotes.
Outra história olímpica que jogou luz sobre a saúde mental de atletas de alto rendimento foi a do surfista Gabriel Medina, favorito ao ouro em Tóquio. O brasileiro foi proibido de levar sua namorada Yasmin Brunet, por ela não ter funções técnicas, o que Medina nega. Para ele, a tranquilidade passada pela parceira seria o segredo para ele ter acumulado os melhores resultados de sua carreira nos últimos meses.
No mundo dos negócios, os tímidos e introvertidos sempre tiveram um caminho mais árduo em cargos de liderança. A questão foi escancarada em 2012, com o livro O Poder dos Quietos, da escritora Susan Cain. Susan falou com a EXAME na época do lançamento do livro, mas suas constatações parecem atuais como nunca.
A pandemia, como todos sabemos, intensificou a demanda para que executivos e empreendedores apareçam em redes sociais e que façam valer sua voz mesmo à distância. O risco é que os introvertidos se afastem das tomadas de decisão — limitando seu impacto nos negócios.
“Corremos de reuniões a reuniões, prazos a prazos, sem momentos para refletir ou ficar sozinhos, em silêncio”, afirmou a autora. “A criatividade depende da reflexão e da quietude para se desenvolver. Da mesma forma, o barulho dissipa a persistência, o que faz as pessoas desistirem mais facilmente de pensar em soluções melhores para resolver algumas questões de forma mais inusitada e, acima de tudo, assertiva”.
Nos esportes, a introversão não pode ser confundida com complacência. A demanda é por atletas cada vez mais engajados nos rumos de seus esportes e nas grandes pautas sociais. Uma versão esportiva para a crescente prevalência do ESG nas empresas — sigla para ambiental, social e governança.
Osaka participou de uma marcha em Minneapolis, Estados Unidos, pelo movimento Vidas Negras Importam e chegou não participar de partidas em protesto. “Sou uma uma mulher negra primeiro, e depois uma atleta”, costuma dizer. Kelvin Hoefler ficou longe da “polêmica”, mas postou uma foto em uma refeição com colegas do time brasileiro. Os quietos, nos negócios e no esporte, não precisam de muitas palavras para dizer muito.
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