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Os mecanismos da mente que ajudam (ou atrapalham) a avaliar riscos como o do coronavírus

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Os mecanismos da mente que ajudam (ou atrapalham) a avaliar riscos como o do coronavírus


Acadêmico que pesquisa tomada de decisões em momentos de incerteza explica o que podemos aprender com a crise de 2008 e defende a criação de uma instância internacional responsável propor políticas para nosso incerto futuro global. Pesquisador David Tuckett diz que tomamos decisões em um estado integrado ou um dividido – o que muda a nossa percepção de risco.
Getty Images/Via Getty Images
Tomamos decisões piores em tempos de incerteza ou de estresse? Não necessariamente, defende um acadêmico britânico, mas desde que saibamos reconhecer a incerteza (em vez de tentar tirá-la do caminho ou ignorá-la).
Para David Tuckett, professor e diretor do Centro de Estudos de Incerteza na Tomada de Decisões, na Faculdade de Ciências do Cérebro da Universidade College London, entender como nossa mente age em meio à incerteza ajuda indivíduos e governos a reduzirem a chance de erros – ou pelo menos serem mais conscientes sobre o que pode dar errado – ao agir e definir políticas públicas em momentos-chave, como crises econômicas agudas ou na atual pandemia do novo coronavírus.
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“Há um pouco de mito criado por acadêmicos e outros de que, em situações de incerteza, você consegue saber se suas decisões serão boas ou ruins antes de tomá-las. Claro que, depois da tomada, é fácil dizer se a decisão foi boa ou ruim. A questão é: sua decisão é boa ou ruim com o que você sabia no momento em que a tomou?”, diz Tuckett à BBC News Brasil.
O acadêmico, que estuda o processo decisório particularmente no mercado financeiro, defende que, nas situações em que o futuro é completamente incerto, adotamos dois jeitos de tomar decisões: um que ele chama de “estado dividido” e outro, de “estado integrado”.
“No estado dividido, você remove a incerteza por essencialmente remover o que lhe cause incerteza – se uma coisa o deixa ansioso, você diz a si mesmo ‘não pense a respeito, apenas decida’. A probabilidade é de que isso leve a uma decisão ruim. Se você toma uma decisão em um estado dividido simplesmente porque não tolera o estresse e a ansiedade, provavelmente não perceberá o que pode dar errado na sua decisão.”
No estado integrado, argumenta ele, a decisão não é necessariamente mais racional nem livre de riscos, mas é fruto de curiosidade, mais bem-informada e preparada para o que pode dar errado – e para a possibilidade de que a decisão tenha de ser revista em um futuro próximo.
“Você talvez precise mudar sua forma de pensar e obter informações. Isso é um estado integrado, em que você sabe que tomou uma decisão que pode dar errado, mas que por isso mesmo você está mais atento à possibilidade de mudar de ideia”, agrega.
“Enfrente o que você não sabe. Seres humanos não são paralisados pelo desconhecido. Computadores, sim – sem informação, eles simplesmente congelam.”
Isso não equivale, diz ele, a escantear a incerteza ou mesmo o risco. Mas, se o contexto permitir, encará-los como chances de testar novas abordagens e produzir inovações.
“Me contaram a história de um projeto que financiava negócios ecológicos, em que um investidor perguntou: ‘como posso ter certeza de que o negócio vai dar certo?’ Essa pessoa nunca vai financiar um negócio inovador”, porque essa certeza simplesmente não existe, defende Tuckett.
O pesquisador desenvolveu o que chama de “teoria de narrativa da convicção”. Segundo ela, nossos processos cognitivo e emocional interagem para criar, na nossa mente, uma narrativa sobre o futuro – são histórias que contamos a nós mesmos e que podem nos deixar mais propensos ou não a determinadas decisões.
Isso não é bom ou ruim, mas simplesmente a forma como damos sentido ao mundo, diz Tuckett. O problema é quando as narrativas levam a processos falhos ou passam a ignorar a incerteza radical.
Aprendizados da crise de 2008
Em 2007 e 2008, um dos principais gatilhos para a crise financeira que se espalhou pelo mundo foi a oferta indiscriminada de crédito para a compra de imóveis nos EUA, sem que isso tivesse sido acompanhado de um aumento real de renda dos compradores.
À medida que os juros dos financiamentos subiram, descobriu-se que muitos compradores não seriam capazes de quitar a compra de seus imóveis. É a chamada bolha imobiliária das hipotecas subprime.
Para David Tuckett, o episódio é um exemplo da tomada de decisões em estado dividido, feita com base na narrativa falha de que todos os riscos estavam racionalmente calculados por análises de custo-benefício, como se não houvesse incerteza naquelas operações de crédito.
Até 2008, a crença de muitos agentes envolvidos no mercado imobiliário americano era de que os preços dos imóveis continuariam subindo, sem cogitar que a bolha imobiliária acabaria estourando e gerando uma onda de desconfiança nas instituições financeiras.
“(As pessoas) eram cegas aos riscos até o ponto em que ficou tão ruim que, quando algumas empresas começaram a se dar mal, ninguém tinha nem ideia do que fazer, e isso levou ao pânico”, diz.
É o erro, argumenta, em se ignorar a “incerteza radical”.
E será que podemos usar esse aprendizado em um mundo incerto sob a pandemia do novo coronavírus?
“Primeiro, olhar com atenção se as pessoas estão levando em conta a incerteza. E isso é uma via de mão dupla – a incerteza nem sempre é ruim, pode ser também liberdade de ação para agir de novas formas. No momento, as pessoas e empresas que vão se sair melhor serão as que se adaptarão melhor à nova circunstância, rapidamente e com mais eficiência. Diria que reconhecer que o futuro não será igual ao passado e que há incerteza é o primeiro desafio.”
‘Preparação global para incertezas’
Outro problema é dificuldade de governos em tomar decisões em tempos de incerteza. Tuckett tem uma opinião polêmica: a de que órgãos fiscalizadores que analisem a posteriori decisões de governos podem acabar sendo, sem querer, mais prejudiciais do que benéficos.
Isso porque esses órgãos acabam forçando governos a tomar decisões que não sejam necessariamente as melhores, mas sim que sejam bem vistas.
“Faz com que os decisores, em vez de agir pensando no que acham que será a melhor decisão naquele momento, ficarão pensando ‘se eu fizer isto, vou me meter em problemas depois (com o órgão fiscalizador)?’ E isso leva a decisões piores, e a menos riscos – e queremos que as pessoas assumam riscos. Não riscos estúpidos, mas, em um mundo em mutação, queremos que as pessoas tentem novas formas de fazer as coisas.”
Nesse contexto, Tuckett é parte de um grupo de acadêmicos que defende a criação de instâncias internacionais – apelidadas de “Órgãos de Prontidão Global” – que elaborem propostas políticas para as incertezas de nosso mundo futuro – desde as novas pandemias que provavelmente virão até crises financeiras e os efeitos da mudança climática.
A ideia parte do argumento de que as estruturas governamentais (ou mesmo órgãos supranacionais atuais, como a Organização Mundial da Saúde) não são capazes de assumir esse papel, principalmente porque suas decisões costumam ser tomadas a portas fechadas e sob influências políticas. E também porque esse tipo de decisão exige investimentos que podem não trazer dividendos políticos.
“Digamos que você seja o presidente do Brasil e tem a escolha de gastar R$ 1 milhão para preparativos (para crises futuras) ou R$ 1 milhão para gastar em algo que vai beneficiar as pessoas agora. É muito tentador gastar agora, porque nos preparativos, o custo é de curto prazo, mas o benefício é de longo prazo, ou mesmo nunca”, diz.
“E um dos maiores problemas da prevenção é que se você é bem-sucedido, ninguém percebe. Por causa dessa assimetria, você precisa de um órgão que analise isso e emita comunicados públicos e transparentes sobre o assunto, um órgão ao qual jornalistas possam fazer perguntas difíceis. A maioria dos governos olha para essas coisas (planejamento estratégico), mas se isso é feito a portas fechadas, as decisões difíceis são tomadas a portas fechadas e, portanto, em um estado dividido.”
“O ‘Órgão Global de Prontidão’ (Office for Global Preparedness, na expressão original em inglês) é necessário porque o futuro é incerto e não há decisões erradas. Tudo o que você pode fazer é questionar, ‘dadas as condições da época, foi uma decisão sensata?’ Por exemplo, acho que posso dizer que, se um governo não tem um plano para o próximo coronavírus, e se a comunidade internacional tampouco tem um plano, então temos um problema. (…) Não dá para erradicar o risco. A questão é como ter uma abordagem sensata e testar se o governo está sendo sensato.”
A ideia é de difícil implementação em um um mundo de recursos públicos que parecem cada vez mais escassos. Mas, em um seminário online para discutir o assunto, o cientista alemão Gerd Gigerenzer, diretor de um centro de estudos de risco da Universidade de Potsdam (Alemanha), argumentou que a incerteza do momento atual coloca em xeque a ideia de otimização de gastos tão defendida por políticas fiscais, particularmente no pós-crise de 2008.
“Os hospitais alemães foram, durante anos, criticados por não otimizar leitos de UTI e equipes médicas, ou seja, por não cortá-los. Agora, na crise do coronavírus, isso se tornou uma das maiores vantagens do país. (…) A otimização é uma ideia linda, mas se aplicada em circunstâncias erradas e sob a incerteza, cria sistemas frágeis e leva a grandes danos.”
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