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'Tive transtorno pós-traumático após minha filha nascer', diz britânico

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'Tive transtorno pós-traumático após minha filha nascer', diz britânico


Elliott Rae, de 38 anos, guardou por meses a angústia de ter visto filha e esposa correrem risco de vida após o parto. Agora, ele quer que outros pais não deixem de externar agonias e problemas de saúde mental, buscando logo ajuda. Elliott reconheceu que precisava de ajuda em 2017, depois que um jornalista perguntou sobre o nascimento da filha.
Elliott Rae via BBC
Por mais de um ano, o britânico Elliott Rae guardou dentro de si uma angústia que nasceu junto com o tumultuado e cheio de imprevistos parto de sua filha. Agora, ele batalha para que homens como ele coloquem para fora seu problemas e emoções — e evitem a agonia pela qual ele passou.
Ele estava no lotado metrô de Londres, quando começou a chorar sem saber por quê.
“Senti uma enorme tristeza”, diz, lembrando-se daquela noite de verão há cinco anos.
Nada em particular acontecera naquele dia para provocar tamanha emoção. Ele havia se levantado com a filha de nove meses, como de costume, e tomou café da manhã com a esposa, Soneni. Em seguida, partiu para trabalhar em Westminster, como funcionário no departamento de transportes local.
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Para familiares, amigos e colegas, parecia que Elliott estava bem. Ele dizia: “estou apenas cansado, me tornei pai recentemente”, e isso seria o suficiente.
Mas a realidade é que, desde o nascimento da filha, ele era atormentado por lembranças dos dias assustadores em que a esposa e a bebê tiveram vários problemas de saúde logo após o parto. Esse passado era suficiente para tirar uma noite de sono ou deixá-lo atordoado em um bate-papo leve com os colegas.
“Não me sentia nem um pouco como eu mesmo”, lembra.
Quando finalmente conseguiu ajuda, Elliott foi diagnosticado com Transtorno de estresse Pós-Traumático (TEPT) e publicou um livro, Dad (‘Pai’, em português), no qual relata suas experiências de paternidade, junto com outros 19 pais.
‘A parteira colocou a neném no peito da minha esposa e houve apenas um silêncio’
O homem de 38 anos nunca se viu como alguém que pudesse desenvolver problemas de saúde mental ou precisar de terapia.
Ainda mais em relação à paternidade: quando Soneni engravidou em 2015, ele ficou radiante.
O trabalho de parto no hospital começou com relativa tranquilidade. O nascimento seria na água e as avós estavam lá para dar apoio, como havia sido planejado.
Mas em poucas horas, a pressão arterial de Soneni começou a subir e a frequência cardíaca do bebê começou a cair, levando à transferência para um outro quarto.
“Aquela sala parecia diferente, mais escura, com muitos equipamentos médicos”, lembra o pai.
Ele se lembra que, às vezes, a parteira apertava um botão vermelho, e em seguida a sala se enchia de médicos.
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Não era assim que ele imaginava que as coisas seriam.
Soneni estava recebendo antibióticos intravenosos porque testes detectaram uma infecção por uma bactéria Streptococcus do Grupo B, e equipe esperava que os medicamentos pudessem evitar a infecção do bebê durante o parto.
Na maioria das vezes, esta infecção não é prejudicial à mãe ou ao bebê — mas, neste caso, era.
Depois de quase 24 horas de trabalho de parto, a bebê nasceu. Ela estava cinzenta e não fazia barulho.
“A parteira colocou a neném no peito da minha esposa e houve apenas um silêncio. Parecia que tudo havia parado.”
Novamente médicos encheram a sala, e Elliott só pôde assistir, incrédulo, sua filha sendo ressuscitada de um lado da sala e sua esposa perdendo uma quantidade preocupante de sangue do outro.
“Parecia que estava assistindo a um filme, e outra pessoa estava vivendo aquilo.”
“Durante o parto, desempenhei um papel, mas ali me sentia impotente e chocado. Tive que dar um passo atrás e confiar em pessoas que não conhecia para salvar minha família.”
Minutos depois, Elliott dava um beijo de até logo em Soneni e acompanhava a filha para uma unidade de terapia intensiva (UTI) neonatal.
“Estava muito preocupado com as duas, mas minha filha tinha cinco minutos de vida. Eu precisava ir com ela.”
“Quando chegamos à UTI neonatal, uma senhora olhou para mim e percebeu que estava desnorteado. Ela me disse que eu precisava me recompor e ajudar minha família.”
Hoje, ele se diz grato por aquelas palavras, porque elas geraram o efeito pretendido. Nos dias que se seguiram, Elliot incorporou uma postura quase profissional de eficiência, indo de um lado a outro para acompanhar muito de perto os quadros da filha e da esposa.
“Não havia tempo” para cair aos prantos, mas voltar para casa na primeira noite sem a bebê nos braços e a esposa foi muito difícil.
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Poucos dias depois, os três conseguiram se acomodar juntos em um quarto do hospital, e a neném se recuperou lentamente da infecção bacteriana.
Depois de 15 dias, a equipe médica passou a falar da volta da família para casa. Elliott e Soneni finalmente sentiram recuperar o fôlego. Tudo ia ficar bem.
Aos cinco minutos de vida, filha de Elliott já precisou ser levada a uma UTI neonatal
Elliote Rae via BBC
Então, de repente, apareceu um protuberância na parte de trás da cabeça da filha. Os médicos ficaram preocupados e pediram uma ressonância magnética para descartar a possibilidade de ter ali coágulos sanguíneos ou até mesmo um tumor cerebral.
Mais uma vez, Elliott sentiu uma total perda do controle.
“Podia sentir a energia sendo sugada do meu corpo. Não tinha mais nenhuma”, lembra o pai. “Nós dois chegamos ao fundo do poço, estávamos em nosso estado mais vulnerável.”
O casal passou a noite em claro e fez orações pela bebê junto com as parteiras.
“Lembro-me de me perguntar de onde vinham todas aquelas lágrimas, porque chorei a noite toda.”
No dia seguinte, ele levou a filha para a sala de exames e colocou o minúsculo corpinho naquele enorme aparelho para adultos.
Após uma angustiada espera pelos resultados, uma enfermeira irrompeu pela porta, puxando os pais para um abraço com um enorme sorriso no rosto. A protuberância não era nada para se preocupar, e a família poderia voltar para casa.
‘Foi como voltar à sensação de desamparo e descontrole do nascimento’
Mas as angústias em relação à saúde da filha não ficaram para trás, no hospital.
“Em todas as semanas dos primeiros meses, ficávamos de prontidão para uma emergência para tudo, a cada fungada”, lembra Elliott.
A maior parte da licença paternidade de Elliott foi usada enquanto a família estava no hospital, então ele logo precisou retornar ao trabalho.
Colegas perguntavam entusiasmados sobre o nascimento, mas ele nunca se sentia à vontade para contar pelo que tinha passado.
Terapia não era algo que Elliott considerasse. Já Soneni logo reconheceu que precisava de ajuda e foi diagnosticada com ansiedade pós-parto meses após o nascimento da filha.
“Me preocupava constantemente e imaginava os piores cenários”, lembra a mãe.
Até que uma grave reação alérgica ao trigo levou a bebê de volta ao hospital, e revelou também que a assistência estava fazendo bem a Soneni.
“Ela lidou com esse episódio muito bem, mas para mim, foi como voltar à sensação de desamparo e descontrole do nascimento”, lembra Elliott.
Foi quando ele começou a apresentar mais sinais de TEPT: insônia, ansiedade e lembranças que surgiam de repente.
“Ele me contava sobre ter experiências como se estivesse fora do próprio corpo. Foi quando comecei a me preocupar”, conta Soneni, chegando às lágrimas ao pensar na pressão que o marido sentiu.
Elliott reconheceu que precisava de ajuda em 2017, depois que um jornalista perguntou sobre o nascimento da filha e ele se viu lutando para abordar o assunto sem ficar angustiado.
Sutilmente, o jornalista sugeriu que ele conversasse com alguém, passando o contato de um médico especializado em traumas e depressão pós-parto.
“Pensava no estresse pós-traumático como algo que só soldados têm depois de ir para a guerra. Agora, sei que ele pode ser desencadeado em qualquer pessoa que passou por um evento traumático, capaz de mudar ou colocar em risco a vida.”
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‘Como homens e pais, é muito incomum se mostrar vulnerável’
Em janeiro de 2016, Elliott criou uma rede online sobre paternidade e estilo de vida chamada Music Football Fatherhood (“Música, futebol e paternidade”). Foi uma saída para falar sobre ser pai de primeira viagem, embora só depois ele tenha abordado o nascimento traumático da filha e o TEPT que desenvolveu.
Outros pais começaram a entrar em contato e a se abrir, o que lhe deu a ideia de escrever um livro, Dad.
“Acho que a maioria dos novos pais passa por angústias em algum momento, e isso é normal. O Music Football Fatherhood me fez perceber isso.”
“Há muitas histórias e não falamos delas em público. A maioria dos homens que está prestes a ter um filho não sabe metade do que é ser pai, porque não falamos sobre isso.”
Elliott quer que seu livro gere novas conversas. Há relatos de homens que sofreram bullying como um novo pai, que criaram filhos sendo viúvos ou foram pais de uma criança que morreu.
“Como homens e pais, é muito incomum se mostrar vulnerável e falar sobre saúde mental. Ainda não é completamente aceitável”, diz o pai, e agora escritor.
Ele acha que há muitas maneiras de preparar os futuros pais.
No seu caso, ele lia blogs e pesquisava coisas práticas, como a preparação do orçamento ou qual carrinho de bebê comprar — mas não ia muito além disso.
“Não pensava direito sobre o tipo de pai que eu queria ser, e não conversei com outros homens da minha vida. Isso nunca me ocorreu”, conta.
Mas agora, por meio do Music Football Fatherhood, ele começou a trabalhar com os serviços de planejamento familiar e acompanhamento pré-natal do NHS (sistema de saúde britânico) para incentivar homens a pensar sobre o que significa ser pai, como sua identidade mudará e o que isso pode significar para seus relacionamentos.
Ele acha que todos os futuros pais devem ter conversas sobre saúde mental, especialmente se estiverem em uma categoria de alto risco — como aqueles com histórico de problemas de saúde mental, que testemunharam partos traumáticos ou cujas parceiras estejam sofrendo de depressão pós-parto.
Para ele, os empregadores também poderiam fazer mais, oferecendo licença paternidade igualitária em relação à maternidade e oportunidades para trabalhar com maior flexibilidade.
“Olhando para trás, poderia ter tido tantas conversas, tantos momentos de intervenção. Mas me sinto sortudo por minha experiência não ter sido tão grave quanto poderia.”
A filha de Elliott e Soneni agora é uma menina de cinco anos alegre e atenta, que adora cachorros e compõe canções enquanto está no banho.
Ela herdou o amor dos pais pela música e pela dança e começou a escrever seus próprios “livros” desde que o pai começou a escrever os dele.

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