O filho do vizinho arranhou meu carro. E agora?
Já ouvi uma piada que dizia que todos os problemas entre vizinhos começavam com a letra C: cano, criança, calçada, cobertura, cachorro, carro…
Seja qual for a letra inicial, o certo é que atritos envolvendo vizinhos e especialmente os filhos dos vizinhos acontecem com frequência e acabam causando mal-estar, brigas e até mesmo disputas judiciais.
Por isso resolvi fazer uma série de posts sobre como resolver algumas dessas situações procurando sempre o caminho da paz em primeiro lugar.
Nessa abertura da série vamos falar sobre o seu precioso carro.
Pois bem, você chegou, estacionou o veículo na porta de casa e o filho do vizinho brincando com o patinete abalroa o carro e faz um risco na lateral.
E agora? Gritar com a criança? Gritar com o vizinho? O que fazer?
Bom, eu aprendi na vida que antes de brigar é melhor conversar, mesmo que você tenha certeza de seu direito.
Então, primeiro “esfrie a cabeça” porque não vai adiantar tentar resolver o problema nervoso, isso provavelmente só causaria mais problemas.
Não se pode esquecer que em muitos casos a relação entre os vizinhos já é conturbada em decorrência de fatos anteriores.
Assim, tente não descontar na criança mesmo que tenha sido de propósito (não podemos descartar essa hipótese) e após se acalmar vá falar com os pais ou responsáveis legais do menor.
O que diz a lei?
A lei estabelece que os pais respondem pelos atos dos filhos porque têm a obrigação de vigiá-los (art. 932, I do Código Civil – responsabilidade in vigilando).
Isso significa, de acordo com o Código Civil (art. 933), que não importa se houve intenção ou não de praticar o ato, seja por parte do menor, seja por parte do responsável, o simples fato de ter ocorrido o prejuízo, uma vez comprovado que foi a atitude do menor quem o causou, gera o dever de indenizar (o nome disso é responsabilidade objetiva).
Primeiro: Verifique se o prejuízo vale a pena o esforço
Tem um filósofo que nós do Direito estudamos na faculdade chamado Rudolf von Ihering que diz algo muito interessante: quando temos um direito violado precisamos escolher entre a paz e o direito.
Isso é uma grande verdade, porque lutar pelo direito muitas vezes vai trazer “dor de cabeça”, gastar tempo, dinheiro, paciência e saliva.
Então é preciso analisar, e isso só você pode fazer, se vale a pena buscar a reparação desse prejuízo seja por quais vias forem ou se você pode suportá-lo e deixar como está.
Quanto maior o valor do estrago maior será a probabilidade de você optar pelo direito e, claro, seu orçamento também deve ser levado em consideração nesse cálculo.
Segundo: Tente solucionar o problema com uma boa conversa
Seguindo o meu conselho, se acalme primeiro e vá conversar com o responsável da criança, lembrando-se sempre de:
1) Narrar o ocorrido com clareza e riqueza de detalhes;
Pessoas se sentem mais confortáveis de gastar o seu dinheiro se souberem com o que estão gastando e porquê.
2) Não ser agressivo;
Esbravejar ou xingar seu vizinho vai fazê-lo ficar na defensiva e assim você reduzirá drasticamente as possibilidades de uma solução amigável.
3) Mostrar-se compreensivo com o fato de que crianças às vezes saem do controle;
Talvez você também seja pai e mostrar que você entende as dificuldades que a outra pessoa passa gera um sentimento de reciprocidade, o qual por sua vez faz com que ela se abra para entender a sua dificuldade tornando o acordo mais propício (isso se chama empatia).
4) Expressar a sua necessidade de ter o prejuízo reparado;
Fazer com que o outro entenda que você assim como ele é alguém que trabalha e luta todos os dias por seu sustento é essencial para que ele entenda a necessidade de arcar com o prejuízo.
5) Leve uma proposta e seja flexível na forma de pagamento;
Se você já apurou o valor do prejuízo leve um valor em mãos, caso contrário negocie também como se dará esta avaliação.
Por fim, seja flexível na forma de pagamento, ou seja, se possível parcele, já que um gasto inesperado também apertará o orçamento do seu vizinho.
Só lembre de nesse caso (parcelamento), fazer algo por escrito para que você tenha mais segurança.
Terceiro: Tente a conciliação ou a mediação
Se você é muito estourado ou já tem um relacionamento desgastado com o vizinho talvez seja melhor nem tentar o tópico anterior, então pode ser o caso de contratar um advogado que saiba trabalhar com negociação.
Claro que essa opção talvez não compense para o caso do risco no carro, mas para outras situações em que o dano seja maior pode ser muito interessante para ambas as partes, porque sairá mais barato que o processo e será consideravelmente mais rápido.
É possível também fazer a conciliação, técnica de resolução de conflitos em que uma terceira pessoa imparcial facilita o diálogo entre as duas partes para que elas próprias realizem um acordo.
Ou a mediação, procedimento mais complexo, no qual o terceiro se comportará de modo ativo podendo inclusive sugestionar propostas às partes que juntas construirão a melhor solução para o problema.
Quarto: Recolha provas e siga para a via judicial
Se no fim nada der certo, então o jeito é recorrer ao Judiciário.
Obtenha o máximo de provas que for possível: pegue os dados de testemunhas, tire fotos e se você morar em condomínio fechado verifique se por acaso as câmeras de segurança não capturaram o momento.
Procure um advogado de sua confiança, a Defensoria Pública se você não puder pagar os honorários ou o setor de atermação do Juizado Especial Cível (JEC) mais próximo da sua casa.
Dê entrada e aguarde, mas não conte com este dinheiro para logo, porque como se sabe o volume de processos tramitando no Judiciário hoje é enorme e, sendo benevolente, no JEC, desde que não haja recurso, você demorará pelo menos 1 ano para conseguir o pagamento.